quinta-feira, 7 de abril de 2011

Chico Xavier um personagem universal


Tribuna do Norte, Natal, 01 de Abril de 2011 às 11:56
Jomar Moraes - jornalista


Conheci Chico Xavier na madrugada de 23 de março de 1970, quinze meses antes de sua participação no "Pinga-Fogo" da TV Tupi, programa em que conquistou o país com seu carisma e mudou para sempre a imagem do Espiritismo no Brasil. Naquela época, Chico contabilizava 43 anos de mediunidade, polêmicas, adversidades e, sobretudo, amparo a carentes do corpo e da alma que o buscavam dia e noite. Eu era um menino, 17 anos, e chegara à Comunhão Espírita Cristã de Uberaba imaginando cenários e falas logo descartados pela realidade.

Em vez do ambiente solene e asséptico de minha fantasia, deparei com um clima de hospital público, com "pacientes" esbarrando-se em espera ansiosa, produzindo uma algaravia que o som de músicas clássicas tentava abafar. Chico encerrara a psicografia daquela noite. Agora, no fundo da sala, aquele homem baixo, franzino, metido num despojado paletó cinza, distribuía sorrisos, beijos e palavras de ânimo numa maratona que, não raro, ia até o amanhecer. Na fila, eu esperava por um recado qualquer de Emmanuel, o guia do médium, mas nenhum espírito iluminado (nem zombeteiro) se deu ao trabalho de me enviar um "torpedo". Em vez disso, ganhei de Chico um abraço como eu jamais experimentara (toque macio e ternura maternal) e um "Deus te abençoe" ao pé do ouvido que me fez conhecer a paz dos anjos sem, contudo, desbastar a frustração de moleque desejoso de um fenômeno retumbante.

Só a maturidade me faria entender, anos depois, aquela madrugada singela no interior de Minas. Sem que os meus sentidos fossem abalados pelo inusitado, revelara-se ali, à minha mente e ao meu coração, a poderosa força que move os grandes sábios e santos: a capacidade de experimentar sua humanidade no limite da virtude essencial, o amor.  Hoje consigo perceber que não foi a vasta e complexa fenomeno-logia que assinalou a trajetória de Chico que o transformou em marco e unanimidade na sociedade brasileira. Afinal, fenômenos mediúnicos sempre existiram e existirão, mas seus efeitos, na maioria das vezes, costumam durar o tempo da excitação dos sentidos. Foi a sua capacidade de materializar o substrato ético de tais eventos que o tornou único e confiável. Como outro Francisco, o pobrezinho de Assis, Chico Xavier empenhou a vida no propósito de provar a viabilidade do amor nas refregas do dia a dia, como exemplificara antes Jesus, o grande inspirador de ambos.

Em Chico, o apóstolo se funde ao homem que, conhecendo suas limitações, descobre no exercício da compaixão o seu grande recurso de superação. Fiel às suas crenças, soube entender a diversidade, respeitando o perfil de cada um. E, graças ao seu trabalho, o Espiritismo iniciado por Allan Kardec, na França, tornou-se um marco de amor e de inclusão da espiritualidade brasileira, em perfeita sintonia com o anseio mundial por alteridade e tolerância. Chico Xavier é nossa mensagem de paz ao mundo.

Uma fé que produz virtudes

Na condição de médium de vastos recursos psíquicos, Chico sempre esteve identificado com as raízes do Espiritismo. Como psicógrafo de centenas de livros que desdobraram e complementaram a codificação kardequiana, foi o grande arauto da consolidação da Doutrina Espírita no século XX. Só isso bastaria para assegurar-lhe um lugar na História. Mas Chico foi além. Ao aplicar à sua vida, de forma incomum, os ensinamentos éticos que permeiam sua obra, transcendeu os limites de "uma" religião para tornar-se uma daquelas figuras missionárias que costumam baixar à Terra em momentos de grandes mudanças.  Nele, o carisma emergiu não apenas da originalidade, da simpatia ou da amabilidade no trato social mas, sobretudo, da coerência quase absoluta entre seus atos cotidianos e os valores universais do amor, da compaixão e do respeito expostos em seus livros.

Algumas virtudes do médium mineiro

1 - Chico era simples. Sua presença despojada, o olhar direto e inocente, as saudações fraternas e o bom humor de suas brincadeiras derrubavam barreiras psicológicas, integrando quem o procurava ao seu círculo de amigos, ainda que por alguns minutos.

2 -  Chico ouvia. E como ouvia! Madrugada adentro, filas de almas a buscá-lo com suas histórias tristes e desconcertantes, que jamais abateram o coração disposto a doar-se.

3 - Chico respeitava o próximo. Não tenho notícia de que alguma vez ele tenha tentado corrigir desnorteados com censuras e imposições. Concitava ao amor e à justiça, respeitando crenças e convicções alheias, certo de que o presença da Providência, em tudo e em todos, gerencia os incontáveis movimentos da vida.

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